05/01/2011

Romance da moça que peidava flores


(Cordel de Guilherme de Faria)

1
Meus amigos, vão ouvir
Uma estória "inusitada"
Para quem não sabe nada
Começo por definir:

2
Este palavrão ostento
Como quem diz “gente pelada
Andando não em quebrada
Mas na igreja ou num convento”.

3
Ou como quando no parto
Um bebê em vez de choro
Diz olhando em volta o quarto:
“Vim desafinar no coro.”

4
Pois bem: havia na vila
Onde vim e fui criado
Uma donzela, a Camila
Com um dom inusitado:

5
A moça soltava pum
Com perfume de jasmim
E isso foi (ai de mim!)
Desgraça pra mais de um.

6
Mas isso só era fatal
Porque a moça era beldade
E quando soltava o tal
Tomava inteira a cidade

7
Principalmente de noite,
Pois lá não tem pé de jasmim,
Assim como não tem “boite”
Com moças de trancelim.

8
Então quando o tal perfume
Invadia ruas e lares
As mulheres tinham ciúme
Das cacholas dos seus pares

9
Pois aquilo era sintoma
De imaginação a voar
Para a fonte do aroma
E seu singelo piscar.

10
Então o nosso prefeito
Pressionado por comadre
Em vésperas de novo pleito

E açulado pelo padre

11
Decretou aquela rolha
Que seria a solução
Para evitar a escolha
Drástica da expulsão.

12
E assim foi a comitiva
Com a presença do padre
Com a rolha e uma "comadre" À casa da nossa diva.


13
Mas depois de uma hora
A aldeia em polvorosa
Viu sair a tal pletora
Comovida e até chorosa.

14
Não se soube na verdade
O que lá dentro ocorreu
Pois a Camila morreu
Em "odores de santidade".

15
Entre peidos e flores
Passamos por esta vida
Ninguém como a falecida
Uniu em si tais odores.

16
Bem... eu bem que alertei
Sobre a estória inusitada
Que eu mesmo testemunhei
E que tenho entranhada

17
Nas narinas da memória
E na visão encantada,
Pois fiz parte desta estória
E da “missão arrolhada”

18
Não esquecendo jamais
O último pum e os ais
Da despedida das flores
E a volta dos maus odores

19
Que a inveja perpetua
Na nossa aldeia mesquinha
Que agora vende e cultua
O “perfume da santinha”...

 

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